REVERENDO BONIFÁCIO

Este pesado e enorme angorá, branco com malhas louras, era (...)o fiel companheiro de Afonso. Tinha nascido em Santa Olávia, e recebera então o nome de Bonifácio: (...) era o «Reverendo Bonifácio»
(in QUEIRÓS, Eça de, Os Maias)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

SIMBOLOGIA


Os Maias estão repletos de símbolos.

Afonso da Maia é uma figura simbólica - o seu nome é simbólico, tal como o de Carlos - o nome do último Stuart, escolhido pela mãe. Carlos irá ser o último Maia - note-se a ironia em forma de presságio.

No Ramalhete, esta designação e o emblema que decora a fachada (o ramo de girassóis) mostram a importância da terra e da província no passado da família Maia. A "gravidade clerical do edifício" demonstra a influência que o clero teve em Portugal e no passado desta família.

Por oposição, as obras de restauro, levadas a cabo por Carlos, introduziram o luxo e a decoração cosmopolita; simbolizam uma nova oportunidade, uma reforma da casa (ou do país) para uma nova etapa - é o reflexo do ideal reformista da Geração de Carlos. Carlos é um símbolo da Geração de 70, tal como o é Ega. Tal como o país, também eles caíram no "vencidismo". No último capítulo, a imagem deixada pelo Ramalhete, abandonado e tristonho, cheio de recordações, está muito relacionado com o modo como Eça via o país, em plena crise do regime.

O quintal do Ramalhete, também sofre uma evolução. O fio de água da cascata é símbolo da eterna melancolia do tempo que passa, dos sentimentos que leva e traz. A estátua de Vénus que, enegrece com a fuga de Maria Monforte, no final a sua presença obscura no quintal é uma vaga premonição da tragédia. Ela marca o início e o fim da acção principal.
No quarto da Toca, o quadro com a cabeça degolada e a enorme coruja empalhada são símbolos e presságios de desgraça. Estes aposentos simbolizam o carácter trágico, a profanação das leis humanas e cristãs.
Também um armário do salão nobre da Toca contém uma simbologia trágica. Os guerreiros simbolizam a heroicidade, os evangelistas, a religião e os troféus agrícolas o trabalho: qualidades que existiram um dia na família (e no Portugal da epopeia). Os dois faunos simbolizam os dois amantes numa atitude hedonista e desprezadora de tudo e todos. No final do romance, um partiu o seu pé de cabra e o outro a flauta bucólica, pormenores que parecem simbolizar o desafio sacrílego dos faunos a tudo quanto era excelso e sublimado na tradição dos antepassados.

Não é difícil ler-se o percurso da família Maia, nas alterações sofridas pelo Ramalhete. No início, o Ramalhete não tem vida. Em seguida, habitado, torna-se símbolo da esperança e da vida, é como que um renascimento. Finalmente, a tragédia abate-se sobre a família e eis a cascata chorando, deitando as últimas gotas de água, a estátua coberta de ferrugem; tudo tem um carácter funéreo. O cedro e o cipreste, são árvores que pela sua longevidade, significam a vida e a morte, foram testemunhas das várias gerações da família.

A morte instala-se nesta família. No Ramalhete todo o mobiliário degradado e disposto em confusão, todos os aposentos melancólicos e frios, tudo deixa transparecer a realidade de destruição e morte. E se os Maias representam Portugal, a morte instalou-se no país.
A Toca é o nome dado à habitação de certos animais, o que, desde logo, parece simbolizar o carácter animalesco do relacionamento de Carlos e Maria Eduarda. Os aposentos de Maria Eduarda simbolizam o carácter trágico, a profanação das leis humanas e cristãs.

Os Maias estão também, povoados de símbolos cromáticos: a cor vermelha tem um carácter duplo, Maria Monforte e Maria Eduarda são portadoras de um vermelho feminino, despertam a sensibilidade à sua volta; espalham a morte. O vermelho é, portanto, o símbolo da paixão excessiva e destruidora.
O vermelho da Vila Balzac é muito intenso, indicando a dimensão essencialmente carnal e efémera dos encontros de amor de Ega e Raquel Cohen.
O tom dourado está também presente, indicando a paixão ardente; anunciando a velhice (o Outono), a proximidade da morte. A morte prefigurada pela cor negra, símbolo de uma paixão possessiva e destruidora.
Mãe e filha conjugam em si estas três cores: elas são, portanto, vida e morte, o divino e o humano, a aparência e a realidade, a força que se torna fraqueza.No final, a estátua de Camões é o símbolo da nostalgia do passado mais recuado do país. Constata-se, assim, que a simbologia d'Os Maias é claramente pressagiosa da tragédia.
http://www.citi.pt/cultura/literatura/romance/eca_queiroz/index.html (com adaptações em 18/05/2009).

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